Muito se fala sobre a importância de uma boa gestão do programa de voluntariado, que proporcione ações sociais bem planejadas.
De fato, para um voluntariado de sucesso, o planejamento deve ser um mantra.
Mas o que pode acontecer se não houver tais atributos?
Este post foi escrito para elucidar algumas consequências de quando se peca na gestão e na coordenação do voluntariado, sob a inspiração do Caderno: Coordenação e Ação Voluntária, disponibilizado pela Fundação Eugénio de Almeida.
Efeitos da falta de estratégia e gestão
“Fazer por fazer”, agir sem coordenação, ser reativo às demandas sem apresentar um plano de trabalho anual, são os modos de operar de um programa que não ocupa relevância dentro da empresa.
A falta de coordenação pode prejudicar o programa de uma forma integral, e são estas algumas consequências de um programa sem estratégia e gestão:
· Percepção de não efetividade por parte do time de líderes investidores, e consequente falta de apoio deles, quando o programa de voluntariado não apresenta processos estruturados e não sabe demonstrar o seu impacto.
· Impossibilidade de medir os impactos, resultados e o retorno sobre o investimento para todos os envolvidos, quando há falta de monitoramento e avaliação.
· Instabilidade e precariedade nos programas desenvolvidos, com risco até mesmo de serem encerrados, ao não haver alinhamento estratégico, continuidade, avaliação e demonstração de resultados para todos os envolvidos.
· Busca obsessiva por resultados imediatos, com muito pouco respeito pela identidade dos processos, prazos e cultura no âmbito local.
· Tendência para a realização de ações pontuais, sem relevância para o calendário e interesses do território, da instituição parceira, ou mesmo para voluntários e a empresa que promove.
· Realização de multiprojetos sem foco ou causas prioritárias, dispersando recursos para fins aleatórios, sem uma lógica estratégica.
· Impressão de apêndice por parte dos parceiros internos, como se o programa de voluntariado fosse um projeto paralelo e externo à estratégia de negócio.
· Desalinhamento do programa com outras estratégias como de sustentabilidade, ESG e Gestão de Pessoas.
Efeitos negativos no relacionamento entre entidades e parceiros do território
Os efeitos da falta de coordenação nas relações internas e externas podem causar riscos de reputação e baixo engajamento.
Veja abaixo alguns riscos nesse aspecto:
· Ausência de comunicação, informação e consulta mútua, falta de visão partilhada e uma enorme probabilidade de avaliar e julgar os parceiros e beneficiários com base no desconhecimento, e no estigma de estereótipos.
· Sobreposição de programas e iniciativas destinados a um mesmo alvo e, muitas vezes, com conteúdos iguais ou parecidos, dando a sensação de que existe uma competição entre os interventores localmente.
· Competitividade ou até rivalidade entre entidades ou grupos de voluntários pela obtenção de recursos, em função exclusiva do retorno de imagem ou outros benefícios.
· Ativismo sob elevadas doses de desorganização e pressa, resultante da ingerência de processos e cronogramas dentro da empresa, que depois exerce pressão sobre o território social, sem respeitar minimamente o caráter lento e prolongado dos processos de mudança social em que se deve enquadrar a ação voluntária.
· Facilitação de uma dependência excessiva em relação aos programas que tutelam ou financiam os programas, ao se propor ações de cunho assistencial, e não estruturante e emancipatório.
· Confusão no relacionamento, por meio de múltiplos contatos com a entidade social para fins descoordenados, tomando tempo dos parceiros sem uma razão lógica, e dificultando a percepção de quem é o porta voz da empresa na comunidade.
· Percepção de áreas parceiras internas de que o programa pertence a apenas uma área (a área gestora) como, por exemplo, às áreas de gestão de pessoas ou marketing, e não como sendo uma iniciativa transversal a toda empresa.
Efeitos negativos da não coordenação & gestão de processos
Os processos são os fluxos gerados, justamente, por uma intenção de monitoramento, eficiência e controle.
Ao haver uma gestão ativa de um programa de voluntariado, imediatamente processos devem ser criados, para facilitar e garantir o seu funcionamento.
Veja abaixo o que pode gerar a negligência na criação e na gestão dos processos:
· A falta de uma política de voluntariado, que por sua vez pode dar lugar para a desorganização e a falta de referência para todos os envolvidos. A falta de política, enquanto um processo essencial, abre espaço para que as partes não conheçam os seus direitos e deveres, e que terceiros interfiram em quais ações de voluntariado deverão ser realizadas.
· Perda de engajamento quando, por exemplo, os voluntários se preparam para atuar e a ação é adiada ou não acontece de forma bem planejada, gerando constrangimentos e frustrações.
· Terceirização excessiva do planejamento e ações para os comitês locais, sem a participação direcionadora de uma área gestora, gerando descrédito e desânimo no processo.
· Falta da capacitação e formação, que permite que erros sejam cometidos em todas as etapas da ação.
· Dificuldade e retrabalho na coleta de dados, resultados e evidências para reportes e auditorias.
· Desencontro e perda de oportunidades por falta de um bom processo/plano de comunicação.
Efeitos do uso não planejado de recursos
Os recursos de investimento para o voluntariado, em geral, são escassos. Logo, quando falamos de recursos precisamos considerar como ganhar escala com os mesmos, além de ativarmos mais parcerias e multiplicarmos o investimento, sem seu desperdício.
Abaixo alguns exemplos do que pode acontecer com a não coordenação de recursos:
· Perda ou multiplicação exagerada de recursos ao não se conhecer os recursos de que os outros parceiros dispõem no próprio território ou âmbito de intervenção, como, por exemplo, quando há o excesso de doações de bens perecíveis com prazo de validade curto, ou de outros bens que acabem por não ser aproveitados.
· Desperdício de tempo dos voluntários e parceiros pela dispersão e multiplicação de atividades quer no planejamento, quer de ação no território.
· Desperdícios de voluntários: excesso de pessoas para uma ação que demandaria menos gente, e que acabam por ficar desmotivadas ao não haver uma contribuição relevante para dar.
· Falta de recursos no dia da ação, por meio de uma provisão incorreta, que impossibilite a atividade, ou dificulte a ação.
· Gestão indevida do orçamento, fazendo voltar ou faltar recursos de acordo com o bom o mau monitoramento da provisão e execução dele.
· Perda da oportunidade de ganho de escala, quando as ações repetem ou reproduzem modelos arcaicos, e não consideram o seu potencial de replicação, por meio das tecnologias digitais, por exemplo.
Invista em uma coordenação qualificada
Por esses e outros motivos é fundamental estar de olho na qualidade da coordenação do programa de voluntariado, presando que a sua gestão alavanque o programa, e não o contrário: estagnando o projeto em um lugar irrelevante ou sem crescimento, quer na comunidade ou dentro da empresa.
Sendo assim, não deixe de valorizar o gestor de voluntariado enquanto um divergente positivo, e as boas práticas de planejamento como um mantra, que garantirão os impactos esperados e levarão a empresa cidadã para um patamar de reconhecimento local e global, por seu posicionamento e resultado socioambiental.