Recentemente li um artigo sobre carreira que, entre outras coisas, citava como o voluntariado é valorizado nos Estados Unidos. No texto, o aluno de uma universidade americana explica, com suas palavras, que em uma das matérias os estudantes são obrigados a prestar serviço voluntário em uma ONG como retribuição à sociedade pelo ensino que recebeu.
Não deixa de ser interessante estimular ou mesmo exigir que os alunos façam estágios não-remunerados em organizações sociais, contribuindo com o desenvolvimento local ao mesmo tempo em que investem em seu próprio crescimento pessoal. É a famosa relação ganha-ganha, em que todos os envolvidos são beneficiados. No entanto, um pequeno detalhe semântico me incomodou no relato do estudante: o uso da palavra “obrigados” para se referir a algo noticiado como voluntário. O termo não se encaixa porque voluntariado é necessariamente algo feito de maneira espontânea, por livre vontade. Se é obrigatório, não pode ser voluntário.
Parece óbvio, mas muitos gestores de Voluntariado Empresarial também se sentem confusos quando o assunto é o estímulo à participação no Programa. São pequenas armadilhas que marcam o limite entre oferecer oportunidades bacanas de atuação social e pressionar os colaboradores para uma prática que não seja exatamente do interesse deles. A mais delicada delas é o engajamento dos líderes de equipe.
É unânime: todos os gestores de voluntariado com quem converso, me dizem que, quando o líder de um time atua como voluntário em uma ação da empresa, a participação da equipe no Programa é muito maior. Isso pode ser bom ou mal sinal, dependendo do contexto. Na história abaixo explico melhor:
Duas situações hipotéticas sobre engajamento de um líder
Imagine uma equipe na qual trabalham o Juca, que tem vontade de atuar como volunário, e a Ana, que prefere dedicar seu tempo apenas ao trabalho ou à sua família. Agora suponhamos que o chefe deles, Marcos, não se envolva nas atividades de voluntariado promovidas pela empresa.
Nesse caso, o Juca poderá se sentir inseguro para participar da ação, principalmente se for no horário do expediente, por medo do chefe encarar sua atitude como desinteresse pelo trabalho ou queda de produtividade. É para evitar essas situações que os gestores de Voluntariado Empresarial promovem o engajamento de lideranças, explicando à média e alta gerência os benefícios do voluntariado para o desenvolvimento de sua equipe e pedindo seu apoio para incentivar os colaboradores da ponta. Na nossa história o Juca se sentirá à vontade para participar das ações sociais se tiver o apoio do Marcos.
Mas neste outro cenário em que Marcos é entusiasta do voluntariado, é importante que ele não se torne insistente de modo que a Ana se sinta obrigada a participar das ações apenas para “ficar bem na fita” ou “fazer média” com o chefe. É essencial que a atuação voluntária seja realmente uma vontade natural de cada pessoa. Caso contrário, a ação deixa de ser voluntária e passa a ser compulsória, o que deturpará o objetivo do Programa e até mesmo os resultados das ações.
Como evitar que o engajamento do líder transforme o voluntariado em algo obrigatório?
A sensibilização de altas e médias lideranças é essencial para um voluntariado empresarial de sucesso. Mas há alguns cuidados que se deve seguir para garantir que este incentivo seja bem dosado. Aqui vão alguns deles:
- É muito bom quando um gerente participa da ação promovida pela empresa. É válido que divulgue a seus colegas e subordinados sua intenção de ir à ação, mas ele deve deixar claro de que está participando por interesse próprio e que, da mesma maneira, cada um deve ir apenas se também tiver uma motivação pessoal;
- O gerente de uma equipe pode e deve encaminhar convites para ações ou recados do Programa de Voluntariado à sua equipe; no entanto, deve evitar frases de incentivos muito agressivas como “quero todo mundo lá”, ou “nos vemos lá” quando sabe que nem todos têm interesse em ir;
- Ao fazer a avaliação de desempenho de seus subordinados, o gestor deve ter o cuidado de não misturar as atividades voluntárias com as atividades específicas do cargo. Existem maneiras paralelas de identificar se uma ação voluntária teve ou não impacto no desenvolvimento de habilidades profissionais de um colaborador, sem influenciar sua avaliação formal. Falamos sobre elas aqui.