O voluntário é reconhecido como agente de transformação, fazendo a ponte e qualificando a atuação social da empresa nos locais em que está presente
Por Claudia Sintoni*
“O voluntariado me fez aprender habilidades humanas, como paciência, perseverança, trabalhar e nunca desistir, fazer incansáveis esforços. ”
Com essa citação de Rishi Banshiwal abrimos esse artigo para dar destaque à alguns aspectos importantes do “Estudo sobre Voluntariado Corporativo Empresarial no Mundo”, finalizado em 2018 pelo Itaú Social.
Algumas mudanças na história
As empresas hoje estão mais preocupadas com os impactos internos na corporação e com a aquisição de habilidades de seus funcionários. Há cerca de cinco anos, estavam preocupadas em alinhar seus programas de voluntariado aos objetivos de negócio. Essa foi uma mudança constatada no estudo, realizado com 47 empresas nacionais, regionais e mundiais, sediadas na Ásia, Europa, África, América do Norte e América do Sul.
Transcorridos mais de 40 anos desde os primeiros programas de voluntariado empresarial, muitos desafios e preocupações permanecem, mas são evidentes as mudanças nas narrativas. Os voluntários e o seu forte compromisso são o maior orgulho apontado pelas empresas. Ou seja, “as pessoas”.
O voluntariado corporativo mais perto das comunidades
O voluntário está sendo considerado como agente de transformação local, alguém que faz a ponte e que qualifica a atuação social da empresa nas comunidades onde está presente. Mais do que considerado, reconhecido. Ele participa cada vez mais das decisões em relação à aplicação do investimento social e das prioridades para a atuação voluntária.
Para além dos muitos exemplos de boas práticas que podem nos servir de referência, o que foi realmente inspirador foi encontrarmos um discurso mais consistente e comprometido com ações verdadeiramente transformadoras.
Os entrevistados nos contam que também é motivo de muito orgulho, por exemplo, constatar que a empresa está buscando soluções concretas para os problemas sociais.
A tendência para a próxima década é que as companhias optem por ações que agreguem valor e gerem mudanças contínuas, ao invés de investirem em projetos focados apenas em atos isolados.
O estudo detectou que empresas começam a reconhecer a importância de se considerar as especificidades regionais no desenho dos programas de voluntariado, o que remonta ao papel do voluntário e à organização em comitês locais.
O V2V, em parceria com a CDM promoverá na próxima quinta – feira (26/09), o webinar “Gestão Social aplicada ao negócio – Como as empresas se aproximas das comunidades através do Voluntariado” que visa justamente orientar os profissionais da área nesse sentido. A inscrição é gratuita e pode ser realizada através desse link.
A maioria das empresas se organiza e administra seus programas de voluntariado por meio de comitês. Essas pequenas células favorecem a conexão com o programa central, o vínculo com os voluntários e as parcerias locais com as organizações da sociedade civil.
Já vemos acontecer experiências de colaboração com programas de várias empresas em ações locais conjuntas. Mas a inovação se traduz em variados formatos de desenho dos programas, seja pelo tema, pela criatividade na conexão com os objetivos de negócios, pelo tipo de ação ou pelo modelo de gestão.
Entre as práticas citadas como inovadoras estão as escolas de líderes, com foco na capacitação dos voluntários que estão na governança dos programas; e o incentivo para que os funcionários proponham atividades com entidades sociais, estratégia capaz de multiplicar o número de ações.
Avanços e desafios
Um fator que pouco avançou nesses últimos anos, segundo o estudo, foi o pensamento avaliativo. As empresas ainda têm dificuldade em avaliar o impacto de suas ações e permanecem considerando como indicadores o registro de horas, de voluntários, das pessoas atendidas ou alcançadas. Porém, o conceito está mais apropriado, mais sólido, e mais empresas entendem seu alcance.
Ainda não há uma adesão ativa aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU) e falta maior compreensão do tema.
A alta liderança tem demonstrado envolvimento com os programas de voluntariado, apoiando, incentivando os colaboradores e participando de algumas ações.
Porém, há pouco engajamento da gerência média, que se traduz em falta de apoio e até uma certa indiferença. Isso pode ser explicado, em parte, pela difícil equação entre a pressão por resultados e a disponibilidade de horas para o funcionário sair do trabalho e atuar na comunidade.
Essa é uma questão que aparece entre as principais preocupações das empresas em relação ao voluntariado: o desafio do equilíbrio entre as responsabilidades como empregado e aquelas que ele tem como voluntário.
Outros pontos de atenção são conciliar o padrão global às necessidades particulares; as ações necessárias com recursos disponíveis e as equipes pequenas; e inovação.
Os principais temas de atuação continuam sendo educação, crianças e jovens, saúde e comunidade em geral. O apoio às catástrofes permanece entre as prioridades, mas muitas estão ajustando as ações às reais necessidades das regiões afetadas e suas populações.
Na prática, querem ir além de ações pontuais de envio de alimentos e materiais, por exemplo. Outra tendência bastante focada em ações específicas são os programas cross-borders ou transnacionais, que envolvem a atuação do voluntariado em outros países.
Para companhias mundiais, ter um programa global de voluntariado ainda é um desafio. A maioria declara não sentir que seu programa é realmente global e consistente.
A experiência do Itaú Social
Nos encontramos exatamente nesse campo, identificando essas mesmas dificuldades e preocupações em um programa que já passa de 15 anos de vida. Ao mesmo tempo em que seguimos perseguindo o objetivo de mobilizar a força dos voluntários em benefício do bem comum. Nesse caminho, há uma iniciativa que merece ser compartilhada e que nos enche de orgulho. Em setembro, realizamos pelo terceiro ano consecutivo a Semana de Ação Voluntária.
Com o apoio do Itaú Social, a iniciativa é organizada e liderada pelos comitês de voluntários do Itaú distribuídos por diversas localidades em que a empesa está presente. Nesta edição, alcançou 17 estados brasileiros e o Distrito Federal, envolvendo mais de 2.100 colaboradores, que puderam convidar para as atividades familiares e amigos.
Ao todo, foram mais de 6.000 beneficiários diretos, entre crianças, adolescentes, jovens e suas famílias. Além do Brasil, a Semana de Ação Voluntária aconteceu também na Argentina, Chile, Colômbia, Paraguai, Reino Unido e Uruguai.
Muitas dessas ações foram planejadas e realizadas em parceria com organizações da sociedade civil, prática que tem ganhado espaço no voluntariado corporativo.
As empresas estão confiando cada vez mais nessas instituições, por reconhecer e valorizar o conhecimento que elas têm da realidade. Líderes voluntários conduzem diálogos com as comunidades com os governos locais e com as instituições que atuam na área e são as grandes conhecedoras dos problemas que todos enfrentam.
Essa constatação reforça a preocupação das companhias com a transformação da sociedade por meio de um corpo de voluntários bem preparados e conectados com as necessidades ao redor do mundo.
Em tempos de opiniões divididas e posições violentamente polarizadas, esses discursos são achados que insistimos em destacar. Programas de voluntariado corporativo guardam uma enorme possibilidade de produzir encontros humanos muito potentes e necessários mundo afora.
Para citar Mónica Galiano, que coordenou o estudo:
“esperamos sinceramente que cada vez mais a energia solidária desses voluntários se espalhe pelo mundo e nos ajude a superar os tempos difíceis, auxiliando no desenvolvimento mais justo no planeta”.
A pesquisa foi realizada pelas pesquisadoras Mónica Galiano, Inma Rodriguez (Brasil), Iraida Manzanilla (Venezuela), Raaida Mannaa (Colômbia), Kathi Dennis (Estados Unidos) e Sarah Hayes (Estados Unidos).
* Claudia Sintoni é especialista em Mobilização Social do Itaú Social.