8 estratégias para criar um programa de voluntariado mais inclusivo

Aproveitando o ultimo post feito pela Roberta Rossi sobre voluntariado e diversidade, decidimos desenvolver o assunto da inclusão quando lemos o texto “8 estratégias para criar um programa de voluntariado mais inclusivo” do blog volunteermatch.org. E por isso segue abaixo uma tradução (com as devidas adaptações) do mesmo e esperamos que seja útil para a sua realidade, e ao mesmo tempo abra as janelas das diferentes realidades em que o voluntariado opera.

Muitas organizações podem ter dificuldades para envolver voluntários que reflitam a diversidade racial e étnica das comunidades em que atuam. Em resposta a essa questão, a Associação de Administração Voluntária de Minnesota (MAVA) embarcou recentemente em um estudo que resultou num conjunto de oito estratégias para criar um programa de voluntariado mais inclusivo dentro de organizações sem fins lucrativos e governamentais. Tais estratégias servem como um ponto de partida para as lideranças que buscam passos concretos para envolver melhor os voluntários em comunidades diversas e imigrantes.

Abaixo está um resumo das oito estratégias, com o nosso olhar para o voluntariado empresarial, e o relatório completo está disponível no site da MAVA.

Estratégia 1: Adaptar sua linguagem.

O termo “voluntariado corporativo” é, como conhecido, usado para descrever a ação de voluntariado formal, em que se doa tempo para uma organização, ou em causas diversas, em ambiente monitorado e supervisionado.

Mas nem todo mundo se refere ao voluntariado com os termos que conhecemos na cultura corporativa.

No dia a dia informal, por exemplo, aprendemos que as pessoas se ajudam como amigas e vizinhas, e esse tipo de solidariedade é predominante em diversas comunidades embora as pessoas não se refiram a ele como voluntárias.

De acordo com um voluntário imigrante dos Camarões, “estamos mais confortáveis ​​com a palavra ‘ajuda’”.

Na posição de gestor de voluntariado, ao se trabalhar com comunidades de imigrantes e grupos étnico-culturais diversos, considere o uso de palavras além de “voluntário”. “Ajuda” pode ser uma boa opção, mas outros termos mais amplos, como “apoio”, “benefício” ou “dar”, também são possibilidades. Por favor, note que isto não significa que você deva eliminar a palavra “voluntário” do seu vocabulário. Use sim a palavra “voluntário”, mas também outras palavras – aquelas que são mais universalmente entendidas – para “falar” com o senso de comunidade de uma pessoa.

Evidentemente, esta é a mais fácil das oito estratégias para se implementar. E também é menos provável que tenha sucesso quando adotada sozinha. Nossa recomendação é adotar essa estratégia juntamente com uma ou mais das outras estratégias abaixo para aumentar suas chances de sucesso.

Estratégia 2: Construir Relacionamentos.

Em nenhuma conversa de engajamento de populações diversificadas pode faltar o tema da construção de relacionamentos, pois esse é um eixo central para o sucesso dessas iniciativas. Muitas pessoas em diferentes culturas dizem que seriam voluntárias se fossem solicitadas, mas acabam não agindo por não serem convidadas. Construir uma rede de relacionamentos e colaboração é o primeiro passo para criar esse diálogo e posterior call to action.

Todas as comunidades possuem sua diversidade. Você enquanto mobilizador de voluntariado precisa identificar as comunidades específicas com as quais deseja se envolver e desenvolver uma rede em cada uma delas. Não há atalhos e pode ser trabalhoso: esteja preparado para articular bastante.

O que ajuda nesse caso é a autenticidade e a confiança. Certifique-se de que você sabe justificar os motivos pelos quais deseja engajar uma comunidade em particular: as razões para si mesmo, para sua organização e os benefícios para a comunidade. Muito dos agrupamentos de público vulnerável já tiveram a infeliz experiência das promessas não cumpridas: de serem abordadas por pessoas e instituições de maneira “proforma”, serem questionados sobre suas opiniões e anseios para que ao final nenhuma ação ou mudança acontecesse em resposta. Isso significa que você pode precisar trabalhar para gerar confiança e mostrar que tem um interesse autêntico em sua participação, opiniões, habilidades e contribuições.

Algumas ideias para construir relacionamentos e essa confiança mútua incluem participar de eventos culturais ou celebrações, “estender a mão” (apoiar) para organizações específicas daquela cultura, receber uma comunidade em espaço aberto (ou o contrário participar e se hospedar em ambientes comunitários), fazer parcerias com locais de culto específicos (sem tomar partido de assuntos políticos e religiosos), e fazer comércio junto e justo com as pessoas e produtores locais.

Estratégia 3: Entender a importância e o status socioeconômico da localidade.

Ao envolver comunidades de diversas raças e etnias, é essencial considerar o status socioeconômico e fazer ajustes que acomodem as especificidades culturais.

Existem passos que você pode tomar para tornar um pouco mais fácil a participação e o envolvimento daqueles públicos que estão em situação de pobreza (ou próximos disso) nas suas ações:

Cuidados Infantis – Oferecer assistência gratuita a crianças em eventos ou reuniões de voluntários pode ser o fator que permita que um dos pais participe. Além disso, considere tornar os eventos de voluntariado adequados para famílias inteiras.

Pagamentos de transportes – O fornecimento de um valor para transporte pode tornar mais fácil para uma pessoa em situação de pobreza ter acesso a oportunidades de voluntariado, especialmente se estiverem longe de sua casa.

Comida – A comida é muitas vezes vista como um “prazer em ter” em reuniões ou eventos, mas é muito mais necessária para públicos de baixa renda. Certifique-se de fornecer alimentos que atendam a qualquer restrição alimentar da população que você está tentando envolver.

Saídas – Muitas organizações sem fins lucrativos recebem ingressos gratuitos para eventos esportivos, produções teatrais e outros passeios para distribuir aos seus. Estes são muito significativos para os públicos e voluntários que, de outra forma, não poderiam pagar por esse passeio.

Além desses cuidados, sempre que possível, realize eventos no território da comunidade com que você atua. Vá até eles, isso torna o voluntariado um pouco mais inclusivo.

Estratégia 4: Disponibilizar oportunidades desenvolvendo competências.

“Voluntários baseados em habilidades” são pessoas que trazem um conjunto de competências especializadas – geralmente que seriam pagas para realizar – para a sua organização.

Um exemplo de ação que una o “voluntariado de competências” com o tema da ajuda humanitária pode ser o convite de imigrantes ou refugiados recentes que ainda não são capazes de trabalhar no seu país ou que desejam construir seus currículos (por exemplo, leia a história de Kajal Patil). (O cuidado nesse exemplo apresentado pelo texto original é garantir que junto às oportunidades de voluntariado sejam garantidas ações de inclusão ao mercado de trabalho, e que não haja exploração nesse sentido. Para o Brasil a Lei do Voluntariado pode ajudar a garantir o equilíbrio para todas as partes).

Veja aqui em nosso blog dois posts sobre a aquisição e o exercício de competências através do voluntariado:

Estratégia 5: Convidar o público beneficiário a ser voluntário também!

A reciprocidade é um conceito importante e intrínseco às comunidades mais vulneráveis. Muitas vezes o sentido de “comunidade” e solidariedade se faz ali literal e é mais vívido que em nossas rotinas privilegiadas.

Nesses contextos, vizinhos ajudando uns aos outros não é apenas uma coisa boa para se fazer: é um estilo de vida, um modo de ser, ou mesmo uma necessidade. E é um sentimento humano natural desejar devolver e multiplicar as ações, as ajudas, apoios e assistências que recebem de forma voluntária.

A sugestão nesse caso é estender a estrutura do seu programa de voluntariado para que as pessoas das comunidades atendidas façam também voluntariado entre si, ampliando o tempo e o eco dos benefícios.

Não há razão para não fazer isso. Organizações que atendem famílias de baixa renda podem supor que seus beneficiários não têm tempo ou recurso extra para doar. Mas isso quase sempre não é o caso. Como você se certifica de que eles se sintam bem-vindos, responsáveis e participantes? Convide-os e envolva-os no planejamento, processo e para a sustentabilidade da ação.

Estratégia 6: Engajar grupos de jovens.

Muitos jovens de comunidades vulneráveis estão confortáveis ​​com o conceito de voluntariado e estão acostumados a participar de projetos sociais. (No Brasil isso é muito vívido com movimentos de periferia de grandes centros urbanos, e um bom exemplo para desde já é o ÉNOIS – Inteligência Jovem).

Uma ótima maneira de envolver diversos jovens é fazer parcerias com grupos já existentes em projetos diversos. Equipes esportivas, clubes de cultura (música, dança, grafite, religiosos) que têm um componente comunitário com alto poder engajador, (uma pesquisa que adoro nesse sentido é O Sonho Brasileiro, que mapeou o sonho de jovens brasileiros para o país e suas funções como “jovens-ponte”).

Entre em contato com os líderes desses grupos para que eles saibam que você tem projetos de voluntariado disponíveis e como seria legal o engajamento do público jovem.

Eu estou sempre ligado no Ruas, Catraca Livre, no Hypeness, no Social Good, mas sei que existem muitos outros.

Estratégia 7: Remover Barreiras que possam impedir a inclusão de determinados públicos.

Certos públicos vulneráveis passam por impedimentos institucionais que são barreiras reais à sua participação como beneficiários e como voluntários. Vale ficar de olho em como ajudar a desatar certos nós para esse tipo de população. Atos simples como o ir e vir podem se tornar inviáveis.

No texto original a autora cita a verificações de antecedentes para imigrantes, segundo ela lá fora “muitas organizações exigem que os voluntários passem por uma verificação de antecedentes, contudo algumas empresas não podem executar verificações de antecedentes sobre pessoas que não possuem cidadania. Existem formas alternativas de executar verificações de antecedentes em seu governo ou organizações sem fins lucrativos, ou existem funções de voluntários que não exigem uma verificação de antecedentes?” e a tradução que faço aqui é de como garantir que a falta de acesso aos direitos políticos, econômicos e sociais não impeçam uma ação voluntária no Brasil, mas pelo contrário, sejam o foco ou recebam o zelo do seu programa de voluntariado. Num post do mês de março, escrevi sobre como realizar voluntariado pautado pelo tema dos Direitos Humanos, vale dar uma olhada, pois o objetivo é garantir ao máximo o exercício da cidadania por todos.

Flexibilidade: Para uma pessoa sem situação vulnerável, o cumprimento de requisitos rigorosos em relação à frequência ou à pontualidade nem sempre é possível. Capacite os voluntários para lidar com isso, utilizando de planos B e C, nos momentos em que houver ausência do público beneficiário.

Políticas exclusivas: Avalie como sua política de voluntariado dialoga com os pactos e acordos assinados pela sua empresa (como o Global Compact, por exemplo), e também com políticas de Direitos Humanos, de Sustentabilidade, com os Códigos de Conduta, e outros direcionamentos internos, locais, nacionais e globais. A intenção é que as cláusulas da política de voluntariado (ou as suas diretrizes) sejam sempre inclusivas, em todos os aspectos.

Estratégia 8: Criar uma cultura organizacional inclusiva.

Criar um ambiente onde voluntários e comunidades de todas as etnias e origens se sintam bem-vindos e incluídos é fundamental para sustentar a presença dos mesmos.

Como você influencia esse tipo de mudança dentro de sua organização, especialmente se você não é um dos principais tomadores de decisões? Pode ser difícil, mas existem passos que você pode seguir.

Trabalhe para educar todos em sua organização sobre a importância de engajar voluntários de diversas origens e experiências. Ajude as pessoas a entenderem como é vital envolver os voluntários que refletem a diversidade racial e étnica da comunidade que você atende e colaborar com eles como parceiros para que isso aconteça. Outra pesquisa sobre diversidade no exercício do voluntariado você pode encontrar aqui nesse link.

Obtenha apoio de líderes organizacionais e peça-lhes para comunicar a mensagem de inclusão. Discuta suas metas para diversificar o grupo de voluntários e peça sua ajuda para criar uma cultura de inclusão mais forte para apoiar seus esforços. Possivelmente prescindirá de uma cultura de diversidade em Recursos Humanos, mas é isso mesmo: uma boa prática social pode influenciar boas práticas internas, ou seja, em que medida o que eu faço externamente possui um bom espelho internamente na minha empresa?

Como gestor de voluntariado você pode ajudar a construa uma cultura de inclusão dentro do seu próprio departamento, e em seguida ir disseminando isso pela empresa. Se você é um profissional de engajamento voluntário, seja intencional em tornar seu próprio programa mais acolhedor. Comece com você e sua equipe, e vá construindo a partir daí.

A autora desse texto adaptado é a Lisa Joyslin, que é Gestora do Programa de Voluntariado Inclusivo na MAVA, onde se concentra em aprender e a envolver melhor as comunidades “racial e etnicamente diversas” como voluntárias. Lisa trabalhou no campo do engajamento voluntário por quase 15 anos e possui mestrado em Políticas Públicas pela Universidade de Minnesota. Link para o texto original: https://blogs.volunteermatch.org/engagingvolunteers/2018/04/26/8-strategies-for-creating-a-more-inclusive-volunteer-program/