Bons Programas de Voluntariado geram legado

*Por Flávia Moraes

Os brasileiros, já há bastante tempo, entenderam que o crescimento econômico não está necessariamente atrelado ao desenvolvimento social e que existe uma necessidade clara de participação individual para a construção de um mundo mais justo e equânime.

Este impulso em exercer cidadania participativa e o crescimento da Sustentabilidade, especialmente da Responsabilidade Social, têm levado as empresas a terem Programas de Voluntariado.

Todos saem ganhando

Ganha a empresa porque insere valores de responsabilidade social e individual no ambiente interno, pela promoção e incentivo de uma cultura de cidadania, e reafirmam seu compromisso com a sociedade.

Ganham os funcionários porque desenvolvem uma nova compreensão e visão de vida, além do orgulho de suas contribuições voluntárias e espontâneas.

E, por fim, ganha a sociedade porque o tecido social é fortalecido, a solidariedade e a convivência humana se engrandecem.

Sobre o desenvolvimento de competências

Mas há que se ter cuidado: ao longo de minha vida dedicada à Sustentabilidade, especialmente à Responsabilidade Social e Programas de Voluntariado, tenho visto um crescente interesse das empresas em usar o Voluntariado Corporativo ou Empresarial para desenvolver competências e habilidades dos funcionários que participam do Programa.

É certo que tanto as competências como as habilidades serão desenvolvidas, mas jamais deveriam ser a razão que leva uma empresa a criar um Programa de Voluntariado. Existem muitas técnicas de desenvolvimento de competências e habilidades já criadas e muito bem testadas que podem ser aplicadas.

E por que não usar o Programa de Voluntariado Empresarial exclusivamente para isso?

A resposta é muito simples – por uma questão ética.

Todo programa de voluntariado vem atender uma demanda social de uma comunidade que possui algum tipo específico de necessidade que pode ser socioambiental, educacional ou ainda um outro tipo de carência. Não é ético uma empresa se aproveitar dessa carência para desenvolver seus próprios funcionários. A razão maior da existência de um Programa de Voluntariado deve ser o desenvolvimento da comunidade que está sendo atendida e fazê-lo de uma forma tão eficiente que provoque a mudança e supra essa carência.

Daí a necessidade de ter um bom projeto de avaliação do Programa de Voluntariado para poder monitorar e verificar se os compromissos assumidos com a comunidade têm gerado os resultados previstos nos objetivos do programa.

Caso os beneficiários das ações de voluntariado tenham sido efetivamente beneficiados, o Programa tem sentido e a Empresa está de fato exercendo sua Responsabilidade Social de uma maneira ética e transformadora. Caso contrário, a empresa corre o risco de estar usando situações de desvantagem para se auto promover.

Perguntas importantes para o gestor do Programa

Sugiro que o gestor do Programa de Voluntariado responda com muita clareza e objetividade as seguintes perguntas:

  1. Quais são as verdadeiras motivações para a criação do Programa?
  2. Por que ter um Programa de Voluntariado?
  3. Quem irá se beneficiar?
  4. Como se materializará esse benefício?
  5. Como será medido o benefício? Ele coloca o beneficiário em um novo patamar?
  6. O que realmente importa para a empresa?
  7. A empresa está disposta a treinar seus voluntários nas questões éticas que envolvem um Programa de Voluntariado? E capacitá-los para exercer o trabalho voluntário?
  8. As parcerias que serão construídas pelo Programa terão um alinhamento ético?
  9. A comunicação a respeito do Programa tomará todos os cuidados para não expor desnecessariamente os beneficiários?

A partir das respostas e com uma compreensão muito clara das motivações, o gestor do Programa poderá então “desenhá-lo”.

O que leva os funcionários a se engajarem no voluntariado?

O funcionário voluntário deve agir por vontade própria e a decisão de participar do Programa tem que ser pessoal e intransferível. À Empresa cabe somente o convite e o estímulo

Algumas motivações individuais

  • Cidadania: ajudar a buscar soluções para os problemas sociais/ambientais. Participar da construção de uma sociedade mais igualitária e justa;
  • Retribuição: oportunidade de retribuir minimamente à sociedade o que foi recebido em ambiente pessoal e profissional dotado de recursos e informações;
  • Valores: possuir valores de direitos humanos, solidariedade e amor ao próximo;
  • Contribuição: querer de alguma forma fazer a diferença e saber que está promovendo a melhoria da qualidade de vida de alguém. Ampliar as chances de desenvolvimento pessoal de outra pessoa;
  • Desenvolvimento pessoal: buscar novas experiências, conhecer novas realidades, interagir com outras pessoas, ampliar sua rede de conhecimento e desenvolver novos talentos;
  • Compromisso com o futuro: assumir responsabilidade individual para a construção de um futuro justo e promissor.

Motivações empresariais

A empresa deve entender muito bem suas motivações e mesmo tendo ganhos deve dar ênfase prioritário às motivações que contribuam efetivamente para o desenvolvimento sustentável e não só para suas motivações “internas”. Listo algumas, sem a expectativa de esgotar o assunto neste artigo.

  • Compromissos éticos: reafirmar seu compromisso ético, de relações duradoras com seus stakeholders;
  • Contribuir para o desenvolvimento da comunidade / sociedade;
  • Responsabilidade Social: inserir valores de responsabilidade individual e social na Cultura Organizacional;
  • Cidadania: promover e incentivar a cultura de cidadania;
  • Consolidar sua reputação e imagem;
  • Contribuição: para motivação, participação, respeito e admiração de seus funcionários;
  • Desenvolvimento: liderança, criar novas relações dentro da própria empresa e por fim novas competências e habilidades que virão como ganhos extras.

Um bom programa de voluntariado gera um legado para seus participantes que carregarão para sempre a experiência da construção coletiva, o sentimento de “dever cumprido” e o exercício da solidariedade.

______________________________________________________________________________

Flávia Moraes é Sócia-diretora da FCM Consultoria em Sustentabilidade com longa experiência no mundo corporativo e consultoria para vários segmentos do 2º e 3º setor. Expertises em Educação para Sustentabilidade, Diversidade e Inclusão, Programas de Ética, Programa de Sustentabilidade: planejamento, implantação e gestão, Responsabilidade Social: planejamento, implantação e gestão/voluntariado.