Como o voluntariado pode ajudar na inclusão das pessoas com deficiência

Tão importante quanto descentralizar os discursos e dar voz às pessoas das diversas posições é estar aberto a aprender com elas.

Para o post desta semana, convidamos Célio Araujo, palestrante de temas relacionados à Motivação, Inclusão Social e Voluntariado, professor, mobilizador social e autor dos livros “Superando o Impossível” e “Caixa Aberta”, para falar sobre sua percepção do voluntariado corporativo e as pessoas com deficiência.

Não deixe de ler, aprender e partilhar conosco o seu ponto de vista.

Voluntariado – Uma ferramenta de inclusão social

* Por Célio Araujo

Nunca foi tão discutida a contratação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho no Brasil como nos tempos atuais.

Com base no artigo 93 da Lei nº 8.213/9, toda empresa com 100 funcionários ou mais é obrigada por lei a ter de 2% a 5% dos cargos preenchidos por colaboradores com deficiência, e esse percentual vem crescendo nos últimos anos devido ao aumento das fiscalizações dos órgãos públicos sobre as corporações.

Fonte: Dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2018.

A inclusão termina na admissão?

Numa população que apresenta 6,7% de pessoas com deficiência, o que se refere a 12,7 milhões de habitantes segundo informações do Instituto Brasileiro de Estatística (IBGE), o número de contratados ainda é baixo.

E agora eu pergunto às poucas empresas que conseguiram cumprir a citada lei e hoje têm em seu quadro de funcionários pessoas com deficiência: “A inclusão termina na admissão? ”.

O desafio nas empresas

Sabemos dos desafios que as empresas enfrentam para se adequar e, e além disso, levar consciência a toda a gestão de que é necessário encarar a realidade como forma de investimento no que diz respeito:

  • às barreiras arquitetônicas (à falta de adaptação dos espaços físicos);
  • aos programas de inclusão que contribuem no treinamento dos demais colaboradores na integração das pessoas com deficiência na empresa;
  • à falta de qualificação do profissional, devido ao seu histórico de vida, que o levou àquela  “deficiência” e fez com que desse uma pausa em seus estudos.

Qualificar esse funcionário e adaptar o ambiente de trabalho ao mesmo, são necessidades para que ele possa produzir e identificar potenciais que talvez nem o próprio conhecia.

Pergunto mais uma vez: “A inclusão termina na admissão? ”.

Compreendendo a pessoa com deficiência

Não podemos descartar que há diferenças nos aspectos psicológicos, emocionais e comportamentais entre  uma Pessoa com Deficiência (PCD) que a adquiriu durante a sua trajetória e a que já nasceu com um tipo de deficiência.

Suas limitações, que a impedem de exercer funções básicas do dia a dia, podem gerar a negação de que a vida continua, inclusive com as debilidades e as impossibilidades enfrentadas, e ao mesmo tempo, podem  causar o impedimento no seu desenvolvimento como ser humano e interferir no seu aprendizado e em suas relações sociais.

Segundo o psicólogo Emilio Figueira, do blog inclusive.org.br, alguns estágios que uma pessoa com deficiência pode passar são os seguintes:

  • Choque: quando elas ainda não captaram o que está acontecendo, ou seja, não têm consciência de que agora possuem uma deficiência e, por isso, ainda não há sinais de ansiedade.
  • Luto: perda da motivação de conviver com essa realidade.
  • Negação: fruto de uma carga de cobrança, quando a pessoa que adquiriu a deficiência sente o status de desvalorização da sociedade. Uma sensação de impotência pessoal e profissional que gera estados de autodesvalorização e sentimentos de segregação ou opressão. À medida que a pessoa for capaz de rompê-los, liberta-se da falsa “proteção” gerada pelo mecanismo de defesa da negação.
  • Raiva: um estado importante de ser manifestado durante a percepção da dimensão da perda, permitindo ao sujeito uma “válvula de escape”. Às vezes, essa raiva é projetada no médico, na equipe de enfermeiros, nos familiares, podendo comprometer ou não o processo de reabilitação.
  • Depressão: pode resultar na diminuição de motivação, refletindo nos tratamentos e atividades.
  • Defesa: gera hostilidade, sendo que algumas pessoas podem permanecer nesse estágio indefinidamente, enquanto outras, numa defesa considerada saudável, somam esforços para enfrentar e buscar sua normalização tão  quanto possível, reconhecendo as barreiras e procurando alternativas para contorná-las.
  • Expectativa de recuperação: ao notar agora que uma nova realidade a cerca, surge a preocupação com a melhora de sua deficiência.
  • Ajustamento: quando a pessoa deixa de considerar suas deficiências como algo em que deva lutar, como uma barreira intransponível, procurando formas de satisfazer suas necessidades e ser um indivíduo incluso na sociedade.

Voluntariado com e para as pessoas com deficiência

Além do que o psicólogo Emilio Figueira citou, ainda questionamos: e o sentimento de inutilidade?

Como contratar uma pessoa com sentimento de esterilidade, improdutividade, com falta de serventia e de utilidade?

Imagine ter um funcionário que já entra imaginando não ser capaz de entregar os resultados esperados e sem ter expectativa alguma de futuro profissional. Na verdade, ele considera a empresa uma “instituição de caridade” que lhe fez um favor para que tivesse um salário no final do mês.

Será que a inclusão termina, então, na admissão?

Mudanças e adaptações são necessárias na vida de qualquer um de nós, em todas as fases que passamos, independentemente de termos uma deficiência ou não. 

Mas depende de cada indivíduo, sendo necessárias apenas ferramentas que possam contribuir para um despertar, sair do estado de lamentações para aprender a conviver com a nova realidade.

A pessoa com deficiência é um agente transformador!

Uma das ferramentas de inclusão que todas as organizações deveriam aplicar são os programas de voluntariado. O trabalho voluntário tem sido relevante no que se refere à inclusão, pois a solidariedade que nos move a pensar no outro, nos provoca a deixar nossas lamúrias de lado, refletindo sobre a realidade social, sobre o fato de que não sou “a única vítima do planeta Terra”.

Empatia, identificação e transformação

A pessoa com deficiência, a partir do momento em que se permite vivenciar o voluntariado, adquire valores inegociáveis, antes ofuscados por sentimentos e comportamentos já citados e que estavam enraizados em seu ser.

Valores como:

  • A igualdade entre os homens, pois neste momento deixa de ser o “inferior”. O que o outro faz, faço também, então, nós dois vamos nos igualar nessa ação ao beneficiário.
  • Respeito à dignidade humana.
  • Justiça social: direito a uma vida digna.
  • Solidariedade humana e ajuda recíproca.
  • Democracia como forma de convivência social (direito de todos à participação e à possibilidade de tomar decisões).
  • em si mesmo e nas próprias potencialidades.
  • Responsabilidade pessoal: compromisso.

Fé em si mesmo, pois agora sou útil, rompendo barreiras que até então pareciam inquebráveis, indestrutíveis, sabendo que é capaz de tomar iniciativas e decisões, se tornando um profissional melhor, um filho melhor, um amigo melhor e acima de tudo um ser humano bem melhor.

A experiência pessoal de uma pessoa com deficiência

Trabalhei em duas grandes empresas que tinham seus programas de voluntariado. Todos os dados e informações que apresentei  acima foram vividos por mim: aos 18 anos fui alvejado por uma bala perdida que atingiu minha medula, causando paraplegia.

Tive os mesmos sentimentos de inutilidade, fiquei em uma cadeira de rodas, no auge de uma carreira como atleta, e sem expectativa nenhuma de vida.

Os programas de voluntariado de algumas empresas contribuíram para o meu desenvolvimento pessoal e profissional, pois neles pude ter experiências como as de gestão dos voluntários, mobilizando-os nas ações sociais, e também como voluntário.

Reconhecimento e identificação

Lembro-me que, uma certa vez, estava agendada uma visita em uma escola pública na cidade de Canoas – Rio Grande do Sul. Fui como representante do banco como voluntário, junto a outros voluntários, para planejarmos as ações sociais.

A gestora escolar comunicou aos alunos que deveriam se comportar, pois receberiam funcionários do banco.

Como de costume, trabalhávamos de terno e gravata. Chegamos à escola justamente na hora do recreio das crianças e quando entramos, vi duas crianças cadeirantes. 

E, nós cadeirantes, somos como motoboys. Quando nos vemos, logo nos cumprimentamos como se já fôssemos amigos. 

Depois, eu e os demais voluntários, entramos na sala da gestora, conversamos e acertamos o que tínhamos que acertar.

Voltei para São Paulo e depois de uns três dias recebi a ligação da gestora escolar, que disse:  

“Celio, sua presença aqui na nossa escola foi muito importante, acredito que você viu dois cadeirantes e ambos chegaram em suas casas naquele dia e falaram para seus pais que haviam conhecido o ‘Dono do Banco’. Mas o que mais chamou a atenção é que disseram que queriam ser igual a você…”.

Mudando de perspectiva

No dia em que recebi essa ligação me emocionei muito e pensei que talvez aquelas crianças, por serem cadeirantes, achavam que dependeriam de seus amiguinhos e familiares pelo resto da vida, porém, viram um cadeirante, o ‘Dono do Banco’, e agora acreditam que podem ser isso também.

Fiz uma ação voluntária “involuntária” e aprendi que, para ajudar o próximo, não precisamos fazer coisas extraordinárias e essa crença pode nos impedir de auxiliar.

Pelo contrário, podemos mudar a realidade de muitas pessoas com pequenos gestos e ações.

Há muitas pessoas precisando do seu sorriso, dos seus ouvidos e da sua presença.

Pessoas que fazem a diferença

Você não acha que 12,7 milhões de pessoas com deficiência possam fazer a diferença participando de  ações sociais, através de programas de voluntariado nas empresas?

Ao se engajarem, esses funcionários poderão contribuir com suas histórias de vida, gerando uma empresa inclusiva e ganhos que serão compartilhados com todos os outros funcionários, com a corporação e com a sociedade.

Então, a inclusão termina na admissão?

Não. E existem várias ferramentas que contribuem para essa inclusão. Uma delas, sem sombra de dúvidas, é o voluntariado.

**Célio Araujo, palestrante de temas relacionados à Motivação, Inclusão Social e Voluntariado, professor, mobilizador social e autor dos livros “Superando o Impossível” e “Caixa Aberta”, para falar sobre sua percepção do voluntariado corporativo e as pessoas com deficiência.

Instituto Remo Meu Rumo (IRMR)

Uma oportunidade de voluntariado na área da inclusão

Se você é de São Paulo, apresentamos uma possibilidade de voluntariado na área da inclusão!

O Instituto Remo Meu Rumo (IRMR), com sede na Raia Olímpica da USP, atua com inclusão e reabilitação via esporte, com aulas de remo, canoagem e natação. Eles atendem desde crianças de 06 anos a jovens de 22, com deficiência física, múltiplas e sem deficiência, pois entendem que: a inclusão começa com a gente”.

Fundado em 03 de julho de 2013, pela Dra. Patrícia Moreno Grangeiro, médica ortopedista e traumatologista, campeã brasileira e sul-americana de Remo e idealizadora do projeto em conjunto com Ana Helena Puccetti, Candido Leonelli e Ricardo Marcondes Macéa, o instituto tem o objetivo de viabilizar a prática de remo e canoagem adaptada para jovens com deficiência física, a fim de promover seu desenvolvimento físico, psíquico e social.

A missão!

Acreditam no voluntariado transformador e desenvolvem o Programa de Voluntariado Remando com o Coração de forma que a comunicação e o acompanhamento sejam cada vez mais qualificados, e os voluntários engajados em sua importante trajetória.

Orientam equipes de voluntários, contribuindo para a difusão da cultura da solidariedade e da cidadania, em conformidade com os objetivos do IRMR. 

Oferecem oportunidades de voluntariado que fazem a diferença no instituto, realizam o processo seletivo e entrevistam o voluntário, apresentando o IRMR e o voluntariado, responsabilidades e ganhos, e a partir dessa reflexão e alinhamento se o voluntário continua escolhendo fazer parte do instituto assina o termo de adesão ao trabalho voluntário e inicia sua atividade.

Oferecem treinamento e acompanhamento, cursos e valorizam e comemoram datas importantes.

Para quem quer embarcar no voluntariado do IRMR é preciso:

  • Ter mais de 18 anos;
  • Preencher o formulário de candidato a voluntário;
  • Participar de entrevista com o coordenador de voluntários;
  • Participar de orientação, treinamento e capacitação oferecidos pelo IRMR;
  • Assinar anualmente o Termo de Adesão ao Serviço Voluntário;

Ter conhecimento e estar de acordo com o Manual do Programa de Voluntariado do IRMR.

“Seguimos todos juntos:  no Voluntariado e Remando com o Coração!”

Todos ganham com a prática do voluntariado:

  • o voluntário, que realiza a ação desenvolvendo talentos e habilidades tais como liderança, trabalho em equipe, empatia, resiliência e criatividade.  
  • O IRMR que recebe a ação, agregando novos saberes, ampliando e fortalecendo seus serviços e programas, e ainda, otimizando os recursos materiais e humanos.  

Uma oportunidade para empresas!

Empresas que têm a oportunidade de  promoverem  seus programas de voluntariado corporativos junto ao IRMR, ampliam o relacionamento com comunidades e fortalecem a imagem institucional e também trabalham valores e propósitos junto a seus colaboradores. 

Remar com o Coração é uma grande oportunidade de fazer parte da construção de uma sociedade mais justa e inclusiva e com mais qualidade de vida para todos!

Para entrar em contato:

www.remomeurumo.org.br / voluntariado@remomeurumo.org.br

2 comentários sobre “Como o voluntariado pode ajudar na inclusão das pessoas com deficiência

  1. Parabéns pelo belo artigo Célio.
    Inquietações pertinentes e que, se bem aproveitadas, serão uma bela contribuição para os RHs das nossas empresas que no geral veem na PCD apenas um cumprimento de cotas imposto por juristas.

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